Ao Conselho Universitário (CONSU/UNIFESP),
Mediante os significativos casos no cenário nacional de violência e assédio contra mulheres e à população trans e travesti, em especial o recente caso do feminicídio da estudante de jornalismo Janaína Bezerra; os coletivos LGBTQIA+, movimento de mulheres Olga Benário e entidades estudantis, estes representados pelos conselheiros, vêm por meio desta carta reivindicar à reitoria e a UNIFESP como um todo a garantia de combate ao assédio a estudantes no âmbito da universidade.
A UNIFESP inicia seu histórico de combate à violência contra a mulher com a prestação de serviço de atendimento às mulheres vítimas violência sexual no Ambulatório de Ginecologia e Obstetrícia da UNIFESP, em 1997. Em 2000 foi inaugurada a Casa de Saúde da Mulher Domingos Deláscio Departamentos de Ginecologia e Obstetrícia, Medicina Preventiva e de Enfermagem, com uma equipe multiprofissional sensibilizada. No primeiro semestre de 2009 foi criado o Núcleo de Prevenção à Violência da UNIFESP (NUPREVI).
O NUPREVI é um órgão consultivo, propositivo, educativo e de pesquisa e tem como missão desenvolver ações na área ao combate à violência sexual e doméstica contra as mulheres, crianças, adolescentes, LGBTQIA+ e outras pessoas em situação de vulnerabilidade. Outra ação desenvolvida pela universidade foi o Programa de Atendimento a Violência e Estresse Pós-traumático (Prove/UNIFESP), o qual é um serviço ambulatorial do Departamento de Psiquiatria da Escola Paulista de Medicina (EPM/UNIFESP) que atende pessoas que desenvolveram Transtorno de Estresse Pós-traumático (TEPT) após situação de violência extrema, em sua maioria, contra a mulher.
O desenvolvimento dessas medidas de combate à violência dentro da universidade é essencial, já que a universidade não está alheia à sociedade. Contudo, ressalta-se que grande parte dessas iniciativas tem suas ações centradas apenas na Escola Paulista de Medicina (EPM/UNIFESP), não chegando aos demais campi, o que tem obrigado os coletivos e organizações estudantis tomarem para si o papel de protagonismo no combate ao assédio e à violência dentro da Universidade, por meio de criação de notas e ações ações pontuais e isoladas nesses espaços.
Por organização de estudantes, há o CAO (Comissão Anti Opressão) em Diadema, que atua em eventos, auxiliando em casos de assédio sexual, moral e psicológico, onde o assediador é retirado do local do evento e responsabilizado. É uma estrutura autônoma que atua sem recursos e sem ligação institucional que auxilia na promoção da justiça e acolhimento.
Além disso, é importante ressaltar a existência dos coletivos LGBTQIA+, negros e neurodivergentes, que atuam como rede de apoio e promovem permanência simbólica aos estudantes. Por exemplo, o coletivo neurodivergente da UNIFESP é espaço de acolhimento aos estudantes que sofrem de psicofobia, muitas vezes promovida por docentes pelo assédio moral e psicológico, através de falas e atos capacitistas contra pessoas neurodivergentes.
Tais coletivos e organizações estudantis são essenciais de existirem, mas que não são compostos por profissionais da saúde, por assistentes sociais, por psicólogos, portanto conseguem acolher os estudantes, mas não garantem o tratamento integral que necessitam as vítimas de assédio no âmbito universitário.
Em pesquisa realizada em instituições de ensino superior do Amazonas, 38% de estudantes já foram vítimas de algum tipo de violência na faculdade nos últimos cinco anos e 83% avaliaram que ocorrência de algum tipo de violência na universidade durante os próximos seis meses seja provável. Ou seja, o sentimento de insegurança e de violência é cotidiano na vida de estudantes. Os espaços destinados ao acolhimento institucional para os estudantes estão extremamente sucateados, como o NAE onde o número de profissionais não dá conta da demanda estudantil. Não há espaço para denúncia anônima, e estudantes são desencorajados por coordenações e diretorias a buscar meios externos.
Relembrando também as mobilizações no ano anterior (2022) em Diadema, onde estudantes da UNIFESP foram às ruas denunciar casos de roubo e o medo da violência sexual aos arredores do campi, e que houve pouca mobilização institucional para resolver a situação.
Neste sentido, nós, entidades, conselheiros e coletivos abaixo-assinados no presente documento, reivindicamos:
- que a Reitoria, bem como os membros desse Conselho, firmem compromisso para a construção de uma Universidade segura para todes,
- que seja formado, a partir deste Conselho, um Grupo de Trabalho responsável pela elaboração e consolidação de uma Política Institucional de Combate ao Assédio e à Violência dentro da UNIFESP, sendo composto pelo NAE, TAs, Docentes e Discentes.
- Que seja estruturada, pelo GT ou órgão competente, um projeto de extensão que se ocupe, exclusivamente, de subsidiar o mapeamento, apoio, assistência e encaminhamento dos casos sinalizados, visando garantir que os agressores sejam devidamente responsabilizados e a criação de um canal seguro e efetivo de denúncia.
- Que os coletivos e entidades integrem em seus estatutos a obrigatoriedade de uma Comissão Anti Opressão, a fim de garantir a existência de membros responsáveis exclusivamente pelo combate à violência e ao assédio em seus eventos e festas, e que tenha apoio institucional.
Não queremos que ocorra mais um caso como o de Janaína Bezerra, uma mulher que tinha o sonho de ser uma profissional do jornalismo e que durante uma calourada teve seu corpo violentado de maneira cruel, onde foi estuprado e depois morto por asfixia. Este não é o tipo de universidade que queremos, onde não haja compromisso com a vida de nosses estudantes, onde entramos sem garantia de que seremos tratados com o mínimo de dignidade, onde estudantes podem ser violentados por professores e estudantes, através de falas e atos de violência moral, sexual, psicológica e racial.
Esta é uma exigência em solidariedade e de justiça por Janaína Bezerra, para que nenhum caso como este se repita. E também por todes aqueles que não puderam falar, que foram silenciades por não haver espaço onde pudessem ser acolhides.
Assinam:
- Movimento de Mulheres Olga Benário
- Diretório Central dos Estudantes
- Diretório Acadêmico XIV de Março
- Coletivo EPPEN Preta
- Centro Acadêmico de Geografia
- Coletivo LGBTQAI+ Malunguinho
- Centro Acadêmico de Relações Internacionais
- Centro Acadêmico de Direito da UNIFESP – Esperança Garcia
- Centro Acadêmico III de Setembro de Ciências Biológicas
- Centro Acadêmico Professora Anna Canavarro de Ciências
- Núcleo TransUnifesp
- Centro Acadêmico de Ciências Ambientais da UNIFESP
- Victoria Lopes da Silva (conselheira discente)
- Blanca Fernandes (conselheira discente)
- Isabella Catarina (conselheira discente)
- Amanda de Oliveira Aleixo (conselheira discente suplente)
- Diógenes Fagundes dos Santos (conselheiro discente suplente)
- Hendryll Luiz R. B. Silva (conselheiro discente)
- Daniel da Silva Guimarães (conselheiro discente suplente)Daniel da Silva Guimarães (conselheiro discente suplente)